



Entrevistas
“A gente queria trazer um Humberto Mauro vivo para o filme”
Sobrinho-neto de Humberto Mauro (1893-1983), um dos pioneiros do cinema no Brasil, o ator e diretor André Di Mauro se deu conta da importância do irmão de seu avô Haroldo ainda bem pequeno, quando, na escola, viu o curta-metragem João de Barro (1956).
Com o passar dos anos, a admiração só fez crescer, alimentada por sua próprio avô, que sempre fora um grande amigo e admirador do irmão artista. O contato mais profundo com a cinematografia do tio-avô só se daria, contudo, após sua morte, quando André foi convidado para uma mostra de filmes de Mauro, em Cataguases (MG). Após a mostra, André, que já trabalhava com teatro e escrevia, decidiu que faria alguma coisa sobre ele. A primeira foi uma biografia romanceada, lançada em 1997. A segunda, é o filme Humberto Mauro que teve a estreia mundial no Festival de Veneza e que está na programação da 42ª Mostra.
O seu filme me lembrou muito de “Cinema Novo” (40ª Mostra), do Eryk Rocha. Ele foi, de alguma forma, uma inspiração para você?
Com certeza. Quando eu assisti ao filme do Eryk, pensei: “É esse o caminho que quero seguir: quero usar os próprios filmes para falar da construção da cinematografia do Humberto Mauro”. Aí eu chamei o Renato Vallone, que fez a montagem de Cinema Novo, para trabalhar comigo. E foi um trabalho maluco. O Humberto fez mais de 300 filme; eu vi mais de cem, durante três meses, enfurnado do CTAV [Centro Técnico do Audiovisual, no Rio de Janeiro]; usamos, na montagem final, mais de 70 filmes. E nós fomos, ao longo do processo, criando uma dramaturgia. Apesar de eu ter mais de dez entrevistas, que ficaram incríveis, eu fui percebendo, durante a montagem, que aquelas falas não estavam funcionando.
As entrevistas, muitas vezes, empurram os documentários biográficos para o tom laudatório, né?
Sim. Tinha esse risco, e também o risco de transformá-lo em peça de museu. A gente queria trazer um Humberto Mauro vivo para o filme. Por meio das entrevistas que ele próprio deu, conseguimos fazer com que ele mesmo se apresentasse. Eu passei por vários processos ao longo da montagem, mas uma coisa que eu sabia, desde o início, é que o filme não podia ser linear.
Como foram escolhidas as músicas do filme?
A maioria delas pertencia às próprias trilhas dos filmes do Humberto Mauro. A presença de “Trenzinho Caipira” também tem tudo a ver com o universo dele, e com a relação entre ele e Villa-Lobos. Tem um canto das lavadeiras do Jequitinhonha que é próximo de muitos cantos que ele usava. E, no final, tem uma música que eu compus para o filme. Mas, para além da música, existiu toda uma pesquisa sonora muito forte, que ajuda a trazer um hiper-realismo para a cena. Os filmes eram mudos, né? Mas no documentário a gente ouve a gota de água caindo. Acho que as pistas de áudio do filme, que são mais de 50, ajudam a compor o embate entre progresso e natureza, uma das marcas da obra dele.
Ana Paula Sousa
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Sobrinho-neto de Humberto Mauro (1893-1983), um dos pioneiros do cinema no Brasil, o ator e diretor André Di Mauro se deu conta da importância do irmão de seu avô Haroldo ainda bem pequeno, quando, na escola, viu o curta-metragem João de Barro (1956).
Com o passar dos anos, a admiração só fez crescer, alimentada por sua próprio avô, que sempre fora um grande amigo e admirador do irmão artista. O contato mais profundo com a cinematografia do tio-avô só se daria, contudo, após sua morte, quando André foi convidado para uma mostra de filmes de Mauro, em Cataguases (MG). Após a mostra, André, que já trabalhava com teatro e escrevia, decidiu que faria alguma coisa sobre ele. A primeira foi uma biografia romanceada, lançada em 1997. A segunda, é o filme Humberto Mauro que teve a estreia mundial no Festival de Veneza e que está na programação da 42ª Mostra.
O seu filme me lembrou muito de “Cinema Novo” (40ª Mostra), do Eryk Rocha. Ele foi, de alguma forma, uma inspiração para você?
Com certeza. Quando eu assisti ao filme do Eryk, pensei: “É esse o caminho que quero seguir: quero usar os próprios filmes para falar da construção da cinematografia do Humberto Mauro”. Aí eu chamei o Renato Vallone, que fez a montagem de Cinema Novo, para trabalhar comigo. E foi um trabalho maluco. O Humberto fez mais de 300 filme; eu vi mais de cem, durante três meses, enfurnado do CTAV [Centro Técnico do Audiovisual, no Rio de Janeiro]; usamos, na montagem final, mais de 70 filmes. E nós fomos, ao longo do processo, criando uma dramaturgia. Apesar de eu ter mais de dez entrevistas, que ficaram incríveis, eu fui percebendo, durante a montagem, que aquelas falas não estavam funcionando.
As entrevistas, muitas vezes, empurram os documentários biográficos para o tom laudatório, né?
Sim. Tinha esse risco, e também o risco de transformá-lo em peça de museu. A gente queria trazer um Humberto Mauro vivo para o filme. Por meio das entrevistas que ele próprio deu, conseguimos fazer com que ele mesmo se apresentasse. Eu passei por vários processos ao longo da montagem, mas uma coisa que eu sabia, desde o início, é que o filme não podia ser linear.
Como foram escolhidas as músicas do filme?
A maioria delas pertencia às próprias trilhas dos filmes do Humberto Mauro. A presença de “Trenzinho Caipira” também tem tudo a ver com o universo dele, e com a relação entre ele e Villa-Lobos. Tem um canto das lavadeiras do Jequitinhonha que é próximo de muitos cantos que ele usava. E, no final, tem uma música que eu compus para o filme. Mas, para além da música, existiu toda uma pesquisa sonora muito forte, que ajuda a trazer um hiper-realismo para a cena. Os filmes eram mudos, né? Mas no documentário a gente ouve a gota de água caindo. Acho que as pistas de áudio do filme, que são mais de 50, ajudam a compor o embate entre progresso e natureza, uma das marcas da obra dele.
Ana Paula Sousa